20080629

28 DE JUNHO, EU FUI






Imagem caseira




30000 manifestantes foram anunciados. Não sei se chegaríamos a tantos. Estava muito calor e as pessoas dispersavam-se mal chegavam ao Rossio. Sei que muitas palavras de ordem não faziam sentido na minha cabeça: "Está na hora, está na hora do governo se ir embora"... Isto já nós gritávamos há dois ou três anos atrás... Não está na hora, este governo está fora de prazo, como leite que se azedou (ou como a Azeda o Leite). Há muito tempo!

Não tenho dúvida de que grande parte dos manifestantes eram sindicalistas profissionais, mas ainda havia os outros, como eu, que mandei o sindicalismo às urtigas.
A convicção, senti-a diminuta, não sei se pelos 37 graus que se faziam sentir, se apenas porque sim... Sei que vi rostos desanimados, cansados. Tudo o resto soou a dejà-vu: as palavras finais, o hino da CGTP, o hino nacional... (tão horrendo como a bandeira, segundo opinião do mui expedito Miguel Sousa Tavares), mas, direi eu: muito mais agradável tudo isso do que os infra-humanos que se fazem representar com a bandeira e o hino.
Carvalho da Silva falou. E foi nesta altura que as vísceras se me começaram a enrolar. Não o consigo desligar da grua, da tal com que dizia, tempos atrás, podermos empurrar Milu para a rua... Por isso as palavras soaram-me gastas. Mas continuei lá, até ao fim.
Nostálgica do 8 de Março? Sem dúvida! Nesse dia em que , "armada em professora tótó", me comovi e chorei. Mas hoje, olhando para trás, sei que os 100000 não se voltarão a repetir. Soube-o logo, no dia seguinte, pelos comentários de muitos que lá estiveram, mas a quem a indignação parece ter findado ali. "Aquilo" foi como uma onda que, chegada à praia, se esvaíu (talvez um quase tsunami que não deixou estragos, a não ser no âmago de quem lá esteve por verdadeira convicção e sabe que "Roma e Pavia não se fizeram num dia").
Acabadas as palavras, tocados os hinos, dispersei. Eu e o meu cartaz. Ainda se ouvia gaitas de foles e tambores, mas já em final de festa.
Dobrei algumas esquinas e, junto a um caixote de lixo, estava um homem, de sessenta anos, talvez, com ar de ter o banho em dia, a remexer e, como que por magia, dali saíam maçãs, bananas. Dois sacos de plástico estavam já cheios. Outros caixotes já teriam sido visitados. E não sei quem estaria mais envergonhado, se o mágico que transformava lixo em pão, se eu, que não pude deixar de ver tal prestidigitação...
Dei por bem empregue a minha presença ali, no 28 de Junho, debaixo dos 37 graus que se fizeram sentir. A mudança está daquele lado, não do outro.
Voltarei sempre que puder.

3 comentários:

Anónimo disse...

Hurtiga,

são as pessoas como tu que marcam a diferença e que inspiram muitos outros. Para mim, és reforço e inspiração.

Obrigada por teres ido e partilhado connosco o que viste e sentiste. Vale mais um depoimento destes do que manipulações estatísticas ou básicas numéricas de sindicatos e governo passadas depois pelos media com a fórmula pouco original que os tem caracterizado nestas questões. Que me perdoem os bons jornalistas e aqueles que apesar de tentarem não conseguem furar esses esquemas.

Parabéns!!!
Abraço!
M.

Hurtiga disse...

Obrigada pelas palavras :)))
Sempre que eu puder, enquanto eu puder...

Anónimo disse...

Se te admiro!
E pega-se porque ... enquanto eu puder e se eu puder ... e são palavras com muita força!
Bjinho querida Hurtiga!