Vai para seis anos que foi diagnosticada uma doença oncológica à professora X. Um caso entre tantos outros. Apenas mais um caso. O "seu caso".
Leccionava, nesse ano, entre outras, turmas de 12º.
Para além de inúmeras questões que se lhe levantaram a título pessoal e familiar, como iria ela gerir a situação a nível profissional?
Decidiu não tornar público o "seu caso"; na escola, só alguns partilharam com ela o "seu caso", aqueles que, para além de colegas, ela considerava amigos, alguns, muito poucos.
Durante nove meses, camuflou a situação com a criatividade nossa de cada dia. Faltava quase exclusivamente nos dias dos tratamentos. Nunca entregou justificação alguma onde estivesse mencionado o termo "oncologia". Esta foi a forma como ela decidiu agir. Telefonemas e conversas incomodavam-na. Sabia que alguns, se soubessem, não lhe dariam mais do quatro ou cinco meses de vida e espalhariam a notícia mais rápido que Mercúrio. Previu, oh se previu, que muitas conversas de comiseração não seriam mais que conversas da treta. Ela não queria comiseração sequer!
Agarrou-se à vida. Sabia que o seu lado emocional só estaria estabilizado se continuasse a fazer o que sempre fez. E ia para a escola praticamente todos os dias, enfrentar os mais rigorosos juízes, vinte e tal por sala. Os alunos representavam fonte de força e de equilíbrio. Teve "sucesso". Todos os seus alunos de 12º ano obtiveram classificação positiva no exame. A mais alta foi 19,6. Ainda hoje guarda o jornal onde tal está referido, foram quatro ou cinco alunos, a nível nacional, que se aproximaram do 20. A média, essa foi superior à nacional.
Como isto lhe fez bem ao ego! A recompensa por todas as vezes que tinha contrariado o cansaço e a tristeza estava ali, diante dos seus olhos, naquela pauta. Não valia a pena ninguém , colegas nem executivo, dar-lhe os parabéns que não vieram. A recompensa estava ali, no brilho dos olhos dos seus alunos. Chorou, como tantas vezes faz.
Esta podia muito bem ser a sua história, ou a minha.
Por isso, passou a viver a vida a curto prazo, dia-a-dia.
Por isso, a reforma é algo de que se ri. Aliás, se lá chegar é uma benesse que a vida lhe dará.
Por isso, não há sacana de gente nenhuma que seja capaz de denegrir o seu trabalho.
Por isso, quando no próximo ano apresentar os "objectivos individuais" começará assim: "Tal como sempre fiz..."
Com o concurso do ano transacto, passou a titular, mas está-se nas tintas para isso. Ela sabe que a sua estória podia muito bem ser a de outro qualquer e que essa titularidade não proveio do que acabou de ser aqui relatado.
Por isso ela saíu à rua e voltará a sair contra "o estado a que isto chegou", sempre e enquanto puder!
5 comentários:
Sem palavras!
Abraço,
M.
Deixo a minha solidariedade e força à colega. Os seus alunos nunca a esquecerão.
LBF
Gostei muito.
Há pessoas com muita força.
ana
Este caso é um exemplo extraordinário de força e coragem.
Força!
Concordo plenamente com a Marta!
:)
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