20080309

Seremos capazes de encontrar uma forma comum?

Chegada da Marcha da Indignação, fui ao site da FENPROF à procura de informação sobre a grandiosa manifestação a que assisti. Sim, li bem - “cem mil, número confirmado às 17h25” - e prossegui lendo que este foi um “ protesto gigantesco dos educadores e professores portugueses, presentes nesta Marcha da Indignação, a maior manifestação de sempre do sector da Educação. Um oceano de revolta inundou o Terreiro do Paço: é tempo de respeitar os professores e de pôr fim a uma política que os desrespeita e desconsidera”. Fiquei curiosa de saber quais as propostas de luta a partir deste ponto. O que vão agora os professores fazer a seguir para continuar demonstrado o seu descontentamento? Era o que eu procurava saber. A resposta foi “Semana Nacional de Luto nas Escolas: de 10 a 14 de Março”. Luto? Mas luto porquê, por o movimento dos professores estar bem vivo, por se ter conseguido manifestar em conjunto, numa grande Marcha da Indignação, apesar das divergências? Mas será isso razão para os professores fazerem luto? Luto porquê se foram eles que saíram vencedores desta primeira batalha? 100 000 professores e educadores não é número que se menospreze assim. Por que insistem os sindicatos no luto dos professores? Que significado positivo poderá ter esse luto?

E eu, que sou mãe, encarregada de educação e cidadã consciente que se preocupa com a educação? Também devo estar de luto? Não vejo razões. Luto ponho eu quando a causa estiver perdida, quando a escola pública deixar de existir para todos, quando a educação for paga e a qualidade do ensino público preparar os meus filhos apenas para serem mão-de-obra barata, sem formação nem cultura, apenas aptos a aceitar sem questionar que o seu emprego se sujeite à flexigurança, desprovidos de capacidade de argumentação, sem perspectiva histórico-filosófica, sem sentido crítico, sem exigência nem preparação, simplesmente formatados para se adequarem ao sistema. Então aí terei razões para pôr luto pelo futuro comprometido dos meus filhos e pela minha incapacidade de intervenção no presente para não permitir esse futuro.

Ninguém a partir de hoje tem motivos para estar de luto porque a nata dos professores velhos e novos estava ali e havia muitos pais e muitos cidadãos e muita gente, muita gente com vontade de dizer: não estamos contentes, estas políticas não nos servem, não as queremos. Saberão os sindicatos interpretar esta vontade conjunta das massas? Poderá a melhor solução ser submeter os professores a uma semana de luto? E depois virão as férias da Páscoa e tudo ficará para trás? São estes os sindicatos que se propõem a negociar o que não podemos aceitar? Os movimentos dos professores vão contentar-se com esta resposta à sua mobilização?

Foi na procura de uma resposta a esta pergunta que a seguir participei numa reunião dos movimentos dos professores no Ateneu Comercial de Lisboa. Como mãe, encarregada de educação, presidente de uma associação de pais participante no Movimento Associativo dos Pais (MAP), membro da Comissão de Defesa da Escola Pública e cidadã interessada nas questões do ensino, tinha necessidade de saber qual a posição dos movimentos ali presentes em relação à participação obtida por esta Marcha e de que forma deveríamos agir a partir dela.

Parecia simples ter feito sair dali um comunicado em que todos nos congratularíamos pela grandiosidade da Marcha e nos proporíamos a prosseguir o nosso projecto de de defesa unida da escola pública num encontro agendado para o dia 15 de Março em Leiria. Parecia simples encontrar uma forma para exprimir um mesmo conteúdo: continuamos como antes empenhados em defender a escola pública, conservamos na retina a imagem da nossa força quando nos juntamos. Por que tudo parece tão simples quando se vê todas as pessoas caminhando lado a lado por uma mesma causa? Por que tudo se torna tudo tão complicado quando algumas pessoas se juntam para discutir que forma e que fundo dar a esse movimento?

O tempo urge, temos uma semana de reflexão para encontrar as motivações para que esta luta renove o seu sentido. Dentro de uma semana voltaremos a nos reunir, possivelmente em Leiria para determinarmos quais os pontos comuns, que princípios defendemos para a escola pública, que políticas queremos ver retiradas, que acções podemos desenvolver e ajudar outros a desenvolver. Apesar de todas as divergências que possamos ter, se realmente queremos agir em conjunto, e em conjunto com as massas que hoje saíram à rua para dizer BASTA!, valerá a pena orientarmos os nossos movimentos para em conjunto encontrarem uma linha de acção. Se não puder ser uma linha política, porque certamente existirão várias linhas políticas, ao menos que seja uma linha de acção orientada na defesa da escola pública e na defesa de um ensino de qualidade. Se assim for, lá estarei.

Paula Montez

retirado do Blog da Comissão de Defesa da Escola Pública

5 comentários:

Anónimo disse...

não sou professor.
lamento a falta de ministros capazes.
são apenas antifasscitas e proprietários da demcracia.

Anónimo disse...

face à desgraça governamental ainda convidam os professores para dirigir o ministério da instrução pública

Maria José Vitorino disse...

Os professores conseguiram ontem sem necessidade de texto único assinado em negociações, demonstrar a todos nós (professores e não professores, nacionais e não portugueses) coisas fundamentais: a liberdade pratica-se, o coração e a cabeça podem agir em conjunto, a diferença não empata a acção, se for centrada no essencial. Fizeram de facto o luto de formas conhecidas de impotência e baixa auto-estima, que nas escolas e nas vidas de todos nós bem conhecemos. Espero que fiquem bem enterradas. Nesse sentido, o luto aplica-se, exactamente como antidoto do outro luto, o choramingueiro e empatador.
Gosto da expressão linha de acção, porque contém linha de pensamento que assume a transformação. Confio na criatividade de homens e mulheres livres, que nestas 100.000 pesssoas na rua, de todas as idades, encontram alento para tentar, arriscar, comprometer-se e assumir a sua parte da coisa pública. A gente vê-se, por @í :)
Já agora, parabéns ao blog

Anónimo disse...

Maria José Vitorino,

obrigada pelas palavras encorajadoras !
M.

Anónimo disse...

vistam-se como quiserem. mas não comecem já a dividir-se... no fundamental, "muito mais é o que nos une, que aquilo que nos separa".
foi lindo, ontem. :)