20081107

Discurso do Estado da Nação



Imagem do KAOS

A Nação está em péssimo estado. Todos os dias assistimos a uma série de episódios intoleráveis, em qualquer país que se suponha civilizado. Não vou enumerar nada aqui, porque toda a gente sabe do que estou a falar. Têm, estes cinco blogues, a peculiaridade de serem frequentados por leitores de topo de gama, na nossa paupérrima hierarquia cultural. Não tenho, portanto, qualquer problema em que estas palavras não possam ser entendidas em toda a sua limpidez, sem qualquer sombra que seja, ou qualquer sentido dúbio. São o que serão, e dirão o que realmente escreverei.

Nesta imensa assembleia de leitores, que, possivelmente, nunca conhecerei, estão, se a estatística do Mundo ainda for o que era, sentadas e representadas todas as pluralidades do pensamento, da inclinação política e do cromatismo cultural. É a todas elas que me dirijo. Para quem tenha acompanhado o que escrevo, sabe que me move infinitamente mais a postura ética do que qualquer clubismo ideológico.

A Ética desapareceu do horizonte. Sábado, amanhã, o que se prepara em Lisboa não é um solavanco de franjas com tiques partidários, ou de associações que vêm tocar a sua pequena trombeta local, não, sábado, em Lisboa, não vai, sequer, acontecer uma Manifestação de Professores, ou Sindicatos. O que vai acontecer, sábado, em Lisboa, não é um protesto contra um apêndice político qualquer. A Pasta da Educação, em qualquer lugar do Mundo Pós-Iluminista, é o lugar mais crucial de qualquer Governo: quando o nome que lá se coloca é fausto, ele torna-se na epígrafe de uma Sociedade grata; quando se trata de um nome infausto, ele é um longuíssimo epitáfio para gerações e gerações devastadas, as gerações devastadas que levarão um país ao seu total declínio e desaparecimento da História.

Para nosso mal, nós estamos à beira desse precipício. Não vimos sancionar qualquer nome político. Muitos de nós, colocaram o seu voto naquela mesma urna que levou ao poder José Sócrates. Isso é um assunto, outro assunto, bem mais duro, é que nenhum português, no seu perfeito estado de sanidade mental, hoje votaria, se o pudesse fazer, no nome de Lurdes Rodrigues para o cargo que ocupa. Ela representa, não o vexame de toda uma classe profissional, por acaso, das mais habilitadas do nosso Estado-Nação, mas a própria grangrena da nossa Contemporaneidade, enquanto expressão Educacional e Cultural. Nunca tanto a Doença de um Estado esteve tão claramente associado a um só nome.

No Sábado, o que vem para a rua é voz do Direito de Aprender, e a Dignidade de Ser, não a do ser profissional, mas do humano de que se reveste a capa de uma profissão, por acaso, num tão-só por pequeno acaso, o lugar do Professor.

Num tempo grado, todos nós fomos alunos, e sabemos o espantoso património que é aquele fragmento de memória que foi termo-nos cruzado, uma só vez, com aquele vulto e aquela voz que nos despertou para a grandiosidade de Ser Pessoa, de Ser Humano, e esse delido vulto foi, muitas vezes, um inesperado, e discreto… professor.

No extremo oposto de toda esta filigrana da sensibilidade e do saber, uma luz volátil que todos vivemos, mas dificilmente poderíamos verbalizar, em todo o esplendor que merecesse, Lurdes Rodrigues é uma Gangrena que não suporta qualquer classificação. Relembramo-nos todos os horrores da impiedade dos sistemas totalitários, das pedagogias assentes na opressão e na mutilação, das violências e das injustiças perpretadas sobre a Criança. Lurdes Rodrigues incarna todas as violações da sensibilidade humana, e a sua própria existência é uma permanente obrigação de, diaria e brutalmente, mergulharmos nos aspectos mais traumáticos das nossas próprias infâncias.


Somos humanos, e recebemos a mais alta tarefa que pode ser concedida a um ser humano: o de formar um outro ser humano.


Sábado, não vimos discutir minúcias técnicas, nem patamares de comodidade financeira. Não vimos ostracizar o Partido A, B ou C. Não vimos pedir um punhado de cêntimos, nem pergaminhos que nos distingam de uma população, toda ela martirizada por uma comédia de um poder ridículo, que diariamente nos envergonha, interna e externamente.
Sábado, vimos, tão-só, a Lisboa, dizer que, à cabeça do volátil processo que é a consolidação do Saber, através de um fragilíssimo objecto que envolve Conhecimento, Fascínio, Afectividade e Emoção, Portugal tem, em finais de 2008, não um ser humano, mas um MONSTRO, em todas as suas vertentes de impiedade e cegueira. E é esse MONSTRO que nós queremos apear.


(Pentagrama reflexivo, no "Arrebenta-SOL", no "A Sinistra Ministra", no "Democracia em Portugal", no "KLANDESTINO", e em "The Braganza Mothers")

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